14/01/2009 - 16:32 por Mark Moring
Filmes para mudar o mundo
2008 foi o ano dos documentários para conscientização social.
Bem, nem todo o mundo. Um grupo de mulheres no Sudão, bem longe dessas luzes ofuscantes, estará fazendo algo muito mais significativo: indo de porta em porta para conseguir juntar um milhão de assinaturas para uma petição exigindo a paz naquele país devastado pela guerra.
Sim, há conexão entre esses dois parágrafos, porque, de certa forma, o primeiro levou ao segundo. Um filme vencedor do Oscar moveu aquelas mulheres sudanesas a tomar uma posição, pois viram outras fazerem o mesmo na telona.
Manda o Diabo Para o Inferno, documentário sobre como as mulheres na Libéria exigiram – e finalmente conseguiram – a paz em sua própria nação, é desses filmes que move não só a alma, como as mãos e os pés também. Foi um dos muitos filmes do deste tipo lançados em 2008, ano de documentários cujos temas são voltados não só a informar, mas também a reformar, encorajando expectadores a serem agentes de mudança.
Quando centenas de mulheres do Sudão vieram para Khartoum para a seleção do produtor Abigail E. Disney de Manda o Diabo Para o Inferno, ficaram depois para uma discussão. Duas horas e meia mais tarde, as mulheres tinham esboçado uma petição pedindo a paz em Darfur e, agora, estão no processo de aquisição das assinaturas.
“Isso é o tipo de coisa que um filme pode despertar nas pessoas”, diz Disney. “Acredito muito na força dos filmes e suas histórias, e em como podem mudar as pessoas”.
Filmes como Manda o Diabo Para o Inferno geralmente não chamam muito a atenção nas cerimônias do Oscar – ou nas bilheterias. Mas alguém poderia dizer que tais documentários são os filmes mais importantes em qualquer ano por sua habilidade em estimular os expectadores a agir.
Alguns filmes começam exatamente com essa intenção, como Call + Response (em português, “Chamada + Resposta”), um documentário sobre o tráfego humano cujo título soa claramente como um apelo à ação. Outros projetos, como Manda o Diabo Para o Inferno e As We Forgive (em português, “Assim Como Nós Perdoamos”), que descreve os esforços de reconciliação em Ruanda, não foram feitos para incitar mudanças, mas acabaram tendo um efeito parecido.
“Não foi minha intenção original, mas acabou sendo o resultado assim que as pessoas assistiram ao filme e depois perguntaram: ‘o que podemos fazer?’”, diz Laura Waters Hinson, diretora de As We Forgive. “Não estamos tentando responsabilizar as pessoas a tomarem uma atitude”.
As pessoas que geralmente pulam os créditos finais estão assistindo a esses filmes, procurando meios de achar respostas. Os créditos dos filmes geralmente mostram websites e dão sugestões para os próximos passos.
“Imagens falam mais alto que palavras”, diz Jennifer Merin, roteirista da seção About.com nos documentários. “Os filmes têm mais probabilidade de alcançar a massa crítica ao chamar a atenção do público para um assunto importante; podem realmente influenciar a opinião pública, e isso pode levar a mudanças na política e na prática”.
“Um filme combina várias disciplinas de arte e, cada uma delas, isoladamente ou em conjunto, tem a capacidade de mover alguém”, diz Jeffrey Sparks, presidente da Heartland Truly Moving Pictures, que realiza um festival anual promovendo o melhor dos filmes independentes, incluindo documentários. “Mas um filme reúne as disciplinas em um arsenal que é simplesmente único em sua habilidade de evocar, arrebatar e inspirar”.
Evocar, arrebatar e inspirar. Três palavras muito boas para descrever os seguintes documentários. Todos entre os melhores de 2008 – e todos de olho nas mudanças do mundo.
Manda o Diabo Para o Inferno – A fé realmente pode mover as montanhas – e os líderes do mal que trouxeram a destruição a uma nação fundada para ser um lar para os escravos libertos dos Estados Unidos.
O filme é narrado por Leymah Gbowee, uma mulher liberiana que tinha o sonho de “juntar as mulheres da igreja para orar pela paz”. Ela formou o Grupo de Iniciativa das Mulheres Cristãs, cujos membros arriscaram suas vidas enquanto organizavam greves e protestos para exigir o fim à violência. Suas atitudes não só finalmente trouxeram a paz, mas também o exílio do presidente Charles Taylor (mais tarde acusado de crimes de guerra) e a eleição da primeira mulher chefe de Estado da África.
Gbowee conta ao Christianity Today que sua fé a manteve firme para passar pelos momentos mais difíceis: “Uma passagem ficava martelando em minha mente: o Salmo 121”, ela diz. “‘Elevo os meus olhos para os montes. De onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor...’. Quando eu lia isso, o sentido da paz vinha sobre mim. O ministério que recebi de Deus foi: ‘tome conta dos meus negócios – os negócios que lhe entreguei – e Eu tomarei conta dos seus.’”
O website de Manda o Diabo Para o Inferno inclui links para Peace Is Loud, uma organização que apóia ativistas da paz em todo o mundo; para venda de camisetas; e para Global Goods Partners, que lida com a pobreza e promove justiça social por meio de iniciativas lideradas por mulheres.
As We Forgive – Quando Ruanda libertou, vários anos atrás, mais de 50 mil criminosos do genocídio de 1994 da prisão, os observadores imaginavam o que iria acontecer. Hinson, que estava em uma viagem com sua igreja à nação africana em 2005, ficou estupefata em ver muitos dos assassinos se reconciliando com as vítimas sobreviventes, inclusive construindo casas para elas.
“Eu não acreditava que as pessoas pudessem realmente perdoar depois de algo tão horrível”, diz Hinson. “Mas eu sabia que era uma história que o mundo inteiro precisava saber”.
Hinson, que é cristã, soube então que em torno de 10 mil ex-prisioneiros queriam construir casas para suas vítimas, mas não tinham os materiais necessários. Então, em parceria com Prison Fellowship Rwanda, ela começou a campanha Living Bricks, em que os doadores podem comprar tijolos individuais ou financiar casas completas em um vilarejo “onde os sobreviventes e ex-prisioneiros podem viver lado a lado totalmente reconciliados”, diz Hinson.
O website do filme também inclui links com organizações e ministérios ativos em Ruanda.
Call + Response – O músico profissional Justin Dillon, quando soube do alvo do tráfico humano global, organizou alguns concertos para angariar fundos para a Missão de Justiça Internacional. Mas, como queria fazer mais, decidiu fazer um filme sobre o assunto.
“Por mais que eu quisesse ser o cara que derruba as portas de bordéis de crianças e espanca os cafetões, isso não é uma realidade para mim”, diz Dillon. “Então vou apenas fazer aquilo em que sou bom e ver se eu consigo energia para esse movimento”.
O resultado é um “rockmentário” mostrando celebridades (Julia Ormond, Ashley Judd) e músicos (Switchfoot, Natasha Bedingfield, Moby) que se apresentam de graça. Todos os lucros vão para projetos que combatem o tráfico humano. O filme, uma mistura de cenas de documentários, entrevistas e apresentações musicais, descreve claramente o problema e sugere websites que viabilizam doações para organizações antiescravagistas, de defesa, campanhas de alerta e muito mais. No mês de lançamento do filme, só a venda das entradas arrecadou mais de US$ 20 mil para esses projetos, e mais outros milhares foram angariados por intermédio de doações pelos websites e mensagens de texto.
War Child – “Saí de casa aos sete anos/ um ano depois estava carregando uma AK-47”. Então entra a letra de música do artista hip-hop Emmanuel Jal, personagem-título desse filme irresistível. Garoto pego no caos da guerra civil do Sudão, Jal foi um dos 10 mil soldados infantis recrutados pelo Exército de Libertação do Povo Sudanês, forçados a matar e se envolver em outras atrocidades. Jal finalmente escapou e deixou seu país. Hoje, uma estrela da música norte-americana em ascensão, viaja o mundo compartilhando sua história, inclusive nos corredores dos escritórios do governo.
Jal e o mais recente apelo do filme são pela paz no Sudão, seu país. Ele quer ser parte desse processo, construindo uma escola em seu antigo vilarejo. “Se as pessoas estudarem, haverá menos guerra”, diz ele. Os créditos finais do filme mostram como os expectadores podem doar para a nova escola ou patrocinar uma criança sudanesa por intermédio da Gua África, uma organização que Jal fundou.
Matt Dornic, de Washington, D.C., optou por patrocinar uma criança logo depois de assistir ao filme. “Por cem dólares por mês, você ajuda uma criança a ir para a escola e chegar à faculdade – não há como errar”, diz Dornic.
Outros documentários para conscientização social de 2008 incluem We Are Together, sobre órfãos na África do Sul; Flow: For Love of Water, sobre como a privatização do suprimento de água fresca, que está diminuindo no mundo, tem negado água aos pobres; Dear Zachary, uma homenagem do produtor de cinema a um amigo assassinado, e também um chamado à reforma no Canadá; Sons of Lwala, sobre dois irmãos quenianos que foram aos Estados Unidos para se formar em medicina e depois voltaram para casa para terminar uma clínica que o pai havia começado antes de morrer de Aids; Expelled: No Intelligence Allowed, sobre a liberdade (ou falta dela) para discutir a teoria do design inteligente em cenários acadêmicos; A Walk to Beautiful, sobre mulheres etíopes que são rejeitadas e abandonadas depois de partos difíceis deixarem-nas estéreis; I.O.U.S.A., sobre a crescente dívida interna americana e a inevitável crise econômica; Trouble the Water, um olhar pessoal e íntimo sobre a devastação causada pelo Furacão Katrina.
O número desse tipo de documentário e das respostas dos expectadores sugere que eles estão servindo “para abrir os olhos aos cegos, para libertar da prisão os cativos e para livrar do calabouço os que habitam na escuridão” (Is 42:7).
Muitos viram essa luz. E está nas telas de cinema.
Mark Moring é editor de Filmes de Christianity Today.
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